2 de junho de 2010

Agualusa nos faz viajar pela África

José Eduardo Agualusa, autor angolano que já viveu no Brasil e em Portugal, se preocupa com a expansão da literatura africana, principalmente entre os países de língua portuguesa. Em seu livro As Mulheres do Meu Pai, lançado em 2007, é nítida a tentativa de estabelecer um diálogo com o Brasil e Portugal, mas sem esquecer as raízes e a temática africana da obra.

No livro, Laurentina após a morte da mãe, descobre que foi adotada e que, na realidade, é a filha do popular músico angolano Faustino Manso. Acompanhada pelo namorado Mandume, português que renega suas origens africanas, a jovem quer conhecer seu pai e sua família em Angola. Logo que chega ao aeroporto, Laurentina é informada da morte de Faustino e decide ir até ao velório e encontrar com seus parentes. Ao aceitar a proposta de seu primo Bartolomeu, de filmar um documentário sobre a vida de Faustino, acompanhando os lugares em que viveu e as mulheres que amou, Laurentina vai, ao longo da viagem, descobrir mais sobre seu pai e sobre si mesma.

Com uma estrutura basicamente de um “road movie”, na qual as principais passagens ocorrem durante uma viagem, a narrativa principal do livro é contada pelos três protagonistas: Mandume, Laurentina e Bartolomeu. Desta forma, acompanha-se como cada personagem reage e o que sente durante as filmagens do documentário, principalmente quando um triangulo amoroso se forma entre eles.

A trama “recortada”, com uma grande quantidade de personagens e locais, é uma das maiores dificuldades do livro, que em alguns pontos pode até se tornar confuso para o leitor. Além disso, o livro não apresenta os fatos em uma ordem totalmente cronológica, radicalizando este conceito de narrativa “fragmentada/recortada”, na qual diferentes eventos vão formando um quebra-cabeça, em que o leitor deverá juntar algumas peças. Outro fator que ajuda nesta sensação de fragmentação é que diversos gêneros literários surgem ao longo do livro, dessa forma, temos cartas, entrevistas (representando os trechos do documentário), fragmentos de jornais e as próprias anotações dos protagonistas.

A questão da diferença entre o que é ser negro e o que é ser branco permeia por toda trama, especialmente quando se trata de Mandume, o negro que quer ser branco, que tem verdadeira aversão pela África e seus costumes. Além disso, Agualusa constantemente introduz situações em que a questão racial é debatida, principalmente na África do Sul. Além disso, os personagens fogem do típico maniqueísmo, tornando-se figuras complexas, com dilemas bem trabalhados ao longo de toda trama: Laurentina busca sua identidade, Mandume questiona suas origens e Bartolomeu vai descobrir as dificuldades de um relacionamento.

Com uma linguagem simples e repleta de comparações, o autor revela um pouco de sua visão de mundo, principalmente nas questões sociais e raciais. Agualusa, mesmo quando aborda as dificuldades sociais africanas, faz uma descrição tão apaixonada e apaixonante da África e de seus personagens, que dá vontade de conhecer aquele continente, ao mesmo tempo diferente e incrivelmente próximo da realidade brasileira. As Mulheres do Meu Pai é caso em que conteúdo abordado e a forma utilizada mostram-se em sintonia e revelam-se igualmente interessantes e bem trabalhados. Na busca pela afirmação e divulgação da literatura africana, Agualusa acabou criando uma história universal sobre a importância das origens na construção da própria identidade.

Um comentário:

Anônimo disse...

De verdade Fe adorei. Você tras discussões muito interessantes e assuntos super atuais.