31 de janeiro de 2013

Comentário: Holy Motors e A Viagem




“Quem é você?”. O questionamento, que se tornou a base da filosofia ocidental e até de estudos posteriores, mantém a relevância, como comprovam dois filmes distintos, tanto na trama quanto na realização, mas que oferecem o debate sobre o que nos diferencia e nos conecta. De um lado, temos o alternativo Holy Motors, indicado como um dos melhores filmes de 2012 e figura constante em festivais. De outro, A Viagem, filme ambicioso dos realizadores de Matrix, uma produção hollywoodiana que dividiu opiniões e acabou passando desapercebida das premiações. O dois, entretanto, causam reações distintas no público por apostarem em abordagens originais de suas temáticas.   

Holy Motors é um daqueles filmes que não faz questão de se explicar ou apresentar conclusões para o espectador. É possível ler dezenas de comentários e análises distintas sobre o filme, cada uma abordando uma linha de interpretação. Em uma trama mezzo surrealista, acompanhamos Oscar, que entra em uma limousine e recebe `missões” e personagens variados ao longo de um dia, vivendo variadas situações. Dessa maneira, o vemos ele se transformar em uma moradora de rua, um pai de família preocupado e até um doente terminal. Em cada missão, o personagem é tão realista que começamos a nos perguntar qual daqueles seria verdadeiro, ou se todos, de alguma forma, são verdade. Acabamos sem saber se Oscar é um ator, um anjo, um ser imortal ou apenas uma metáfora sobre as máscaras sociais que adotamos ao longo da vida. A dúvida aumenta ainda mais quando Oscar encontra outras pessoas que fazem a mesma coisa que ele.


Afinal, o que diferencial, realmente, a moradora de rua de um doente terminal? Nesse caso, eles são representados pela mesma pessoa, só adotando posturas e roupas diferentes. Não seríamos todos personagens esperando o momento certo de nos produzir e reproduzir nossas falas? Não estaríamos desempenhando sempre os mesmos papéis? Assim como a bela modelo que mesmo raptada por uma criatura bizarra, continua a desfilar e posar para lentes imaginárias, não conseguindo encarar ou se chocar a realidade em que se encontra. Não há respostas definitivas, já que o diretor Leo Carax não quis facilitar para o espectador, deixando a interpretação em aberto, assim como as grandes obras de arte.

Bem mais acessível, A Viagem, apresenta histórias aparentemente distintas, focadas em relacionamentos, nos erros e conflitos de cada época. Dessa forma, acompanhamos a viagem de um navio negreiro, um músico homossexual que tenta criar uma obra-prima, uma investigação jornalística na década de 70, um grupo de idosos tentado fugir do asilo no presente, uma revolução social na Seul do futuro e um mundo devastado após a queda da humanidade. A ligação entre as histórias, muitas vezes, é muito sutil, ressaltada pela ótima edição do filme que consegue conectar momentos que demonstram a mesma intensidade e importância na história daqueles personagens. Simples atitudes no passado podem resultar em uma revolução no futuro, como a garçonete menosprezada que é reverenciada como uma divindade no futuro (uma alusão à origem simples de Jesus?), ou a música, filme e livro que emocionam mesmo após décadas do surgimento. 

A divisão das histórias em diretores diferentes também ajudou a “costurar” a trama, já que os momentos de ação ficaram com os irmãos Wachowski (Matrix, V de Vingança), enquanto as tramas mais emocionantes tiveram a direção de Tom Tykwer (O Perfume, Corra Lola Corra). Além disso, a decisão em usar os mesmos atores em todas as histórias estabelece a ideia de reencarnação e causa e consequência, que permeia toda a trama.  “Tudo está conectado”, diz o cartaz do filme, que é uma adaptação do livro “Cloud Atlas – Além das Nuvens”, considerado infilmável por muito tempo.

Holy Motors e A Viagem estão longe de agradarem a todos, na verdade, são filmes que têm potencial em se tornarem obras cultuadas daqui algum tempo, porém, não é sempre que o cinema atual nos oferece a oportunidade de assistir filmes diferentes, que nos propõem questões e debates tão atuais. Vale a pena dar uma chance!  

2 comentários:

Unknown disse...

Bom dia

Gostaria de fazer uma sugestão para o blog.
Tem algum contato eletrônico?
Agradeço
Plíno Camillo

Guines disse...

Boa tarde Plínio, pode entrar em contato pelo e-mail fguines@hotmail.com!
Agradeço pelo contato
Att