A platéia estava visivelmente constrangida com a apresentação de Miley Cyrus no VMA. Instantaneamente, o assunto dominou as redes sociais e se tornou o momento mais comentado da noite, mesmo com apresentações aguardadas de Katy Perry, Lady Gaga, Justin Timberlake e o retorno de N Sync. Durante a semana, a polêmica sobre a performance que misturava elementos infantis com sexo tomou proporções ainda maiores: não faltaram críticas, piadas e comentários de famosos sobre o caso, defendendo ou crucifixando Miley. A Parents Television Council, conselho de pais para televisão americana, chegou a afirmar que a cantora estava substituindo talento musical por sexo e que a classificação do VMA deveria aumentar. Se por um lado é inegável que a apresentação soou forçada, por outro, Miley conseguiu chamar a atenção necessária e atingiu o objetivo: deixar, de uma vez por todas, a imagem de boa moça que a tornou famosa.
Ver a até então menininha da Disney seminua no palco lambendo Robin Thicke não seria algo que o público esperaria ver da interprete da Hanna Montana até o começo do ano passado, por exemplo. O comportamento um tanto desequilibrado de Miley nos últimos tempos, na realidade, é o ápice de uma série de mudanças que a cantora passou para enterrar o passado. O processo foi gradual e começou no ano passado, quando ela abandou o longo cabelo ondulado e adotou um corte platinado e raspado nas laterais. Ao receber centenas de críticas pelo novo visual, a cantora postou que se sentia livre e que não cederia as pressões e comentários. Defender seu ponto de vista e visual, diferente de Beyoncé que colocou apliques uma semana depois de cortar o cabelo, revelava uma Miley diferente, disposta a lutar pela opinião. Dali em diante, a cantora aproveitou os eventos e editorais para marcar essa transição e explorar a imagem de uma mulher firme, de opinião.
Com o novo estilo já definido, Miley encontrou em We Can't Stop, oferecida primeiramente a Rihanna como uma Party in the USA para adultos, o single que marcaria essa re-invenção também na carreira musical. Em uma letra que exalta as celebrações sem limites, Miley achou a forma de dizer que não se importa mais para as críticas e que em "sua festa" é livre para fazer o que desejar. É como se a cantora tentasse zerar sua trajetória musical e conquistar os mesmos fãs de Rihanna, Ke$ha, Lady Gaga... Em uma recente entrevista para a Bilboard, inclusive, Miley disse que todo o trabalho antes do próximo álbum não mais a representa e deveria ser desconsiderado pelos novos fãs. Nesse contexto, a apresentação do VMA simboliza a tentativa, um tanto forçada, de ser o "marco zero" nessa nova fase de Miley.
Não que a apresentação tenha sido um primor, longe disso. Haveria maneiras muito mais sutis e inteligentes de se impor como uma artista madura do que aparecer com uma lingerie feia e mostrar a língua, para “ter atitude”. Do jeito que foi realizada, faltou sensualidade e sobrou mal gosto. Por outro lado, é chocante constatar que o público que tanto critica Miley continua sendo praticamente o mesmo que criticava Madonna por falar de sexo há mais de 20 atrás. A mesma geração que se orgulha tanto de uma “aparente” liberdade sexual e da troca instantânea de informação, ainda se choca ao ver uma mulher de lingerie na televisão (nesse contexto, inclui-se a reação da família Smith ao ver Lady Gaga no palco, na mesma noite). Será que essa platéia apática de 2013 não acharia a apresentação de Prince em 1991 “muito ousada” e “apelativa”? Será que o antológico beijo lésbico do VMA de 2003 hoje em dia seria considerado uma “tentativa desesperada de chamar atenção?
Além disso, não deixa de ser curioso que outra “cantora Disney” também tenha passado pelos mesmos momentos em busca de maturidade: Britney Spears, após anos como a queridinha do público também quis alterar sua imagem de boa moça, até a sucessão de vexames públicos que culminaram na desastrosa apresentação no VMA 2007, visivelmente alterada, acima do peso e mal conseguindo dublar a própria música. A comparação com Britney pode nem ser tão coincidência, uma vez que Miley conta com a orientação do empresário Larry Rodoph, o mesmo que cuidou da "Princesa do Pop" no auge de sua carreira e teve a direção de Diane Martel, a mesma do clipe 3. Miley percebeu que o público não resiste à uma "good girl gone bad".
A atriz Brooke Shields afirmou que Miley deveria repensar as atitudes “desesperadas”. Não seria igualmente desespero se ela continuasse a posar de boa moça e nunca saísse da zona de conforto? Talvez, a apresentação de Miley tenha sido propositalmente ruim para que, pela primeira vez, seu nome não estivesse atrelado ao seriado que a tornou famosa. Além disso, a "má publicidade" parece ter funcionado e Miley está no centro do mundo pop, sendo debatida com um fervor que não se via desde que Lady Gaga usou o vestido de carne. Nos resta torcer que Miley amadureça e perceba que sem talento e inteligência, nenhuma polêmica ou hit se sustentam por muito tempo e que há formas bem mais originais de chocar que mostrar a língua. No fim, infinitamente melhor ter uma apresentação ruim do que uma apática. Ponto para a "nova" Miley.
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