Se no campo da
música pop Madonna mantém uma carreira icônica, no cinema a história sempre foi bem diferente. Ela desejava ser uma atriz premiada e reconhecida pela crítica (até
se casou com um ator talentoso e um diretor respeitado para lhe dar um
suporte), mas sempre foi motivo de chacota pelos colegas e detonada pela
crítica. Suas melhores interpretações são aquelas em que pode injetar um pouco
do seu próprio jeito e personalidade, como Procurando Susan
Desesperadamente, Dick Tracy e Evita. Depois de abandonar a carreira de atriz,
Madonna não desistiu do cinema e agora dirige filmes, ainda sem o sucesso e reconhecimento
esperado.
Chegamos então a W.E – O Romance do Século, o
segundo longa-metragem da cantora que foi lançado ano passado em festivais. Madonna mostrou-se tão obsessiva por esse
projeto quanto na época de Evita, chegando a abandonar a música por alguns anos
para escrever o roteiro e dar atenção a cada detalhe, da
escalação do elenco até os figurinos que seriam utilizados em cada cena. Lançando com fracasso no mercado internacional e avacalhado pela crítica, o filme chegou ao Brasil nesse ano, em poucas salas, em geral no
circuito alternativo. Depois de conferir W.E, entretanto, podemos comprovar que entre erros e acertos, há uma bela história.
Madonna como diretora: atenção aos detalhes |
Para o bem ou para o mal, o nome Madonna é mais
forte que qualquer coisa que ela faça. Fãs irão assistir e comprar o que ela fizer, preparados
para amar, enquanto quem não gosta ou vai se recusar a assistir ou vai assistir apenas para apontar os defeitos. Aposto
que muitos críticos já tinha a resenha pronta antes mesmo de irem à première. A mídia
brasileira, entretanto, foi mais branda e menos afetada que os comentários dos festivais e apontou o óbvio: Madonna não é um Woody Allen, mas faz um filme com atenção aos detalhes, imagens fortes e boas atuações.
A trama é quase um Julia e Julie com toques
mais dramáticos: acompanhamos a história real de Wallis Simpson, plebéia e
divorciada por quem o rei Edward VIII abdicou o trono. O romance se tornaria
um dos casos mais polêmicos e famosos da história (parte dessa trama é vista do
premiado O Discurso do Rei). No presente, acompanhamos a jovem Wally, que sofre por
estar em um casamento fracassado até que fica fascinada pela
história de Wallis e busca nela o exemplo para mudar de vida. Madonna, então, recheia sua
trama com alguns clichês e situações forçadas, como o guarda-costa russo, culto
e sensível, por quem Wally se apaixona ou o marido insensível e unilateral, que
aparece na trama apenas para humilhar nossa protagonista. No fundo, W.E só ganha força com a história de Wallis
e Edward, ao mostrar o outro lado e contar um belo caso de
amor, capaz de alterar os rumos de uma nação.
W.E ganha força com a história real |
As protagonistas, no fundo, possuem muito da
própria Madonna. A cantora escreveu o roteiro quando estava no fim do casamento
com o diretor Guy Ritchie, momento em que pipocavam na mídia boatos sobre as
adoções feitas pelo casal e brigas constantes. Assim
como Wally, Madonna se apegou desesperadamente na história de Wallis em busca da fórmula de um grande amor, tendo acesso as cartas que eles
trocavam e estudando tudo sobre o casal. Foi então que ela percebeu que mesmo
eles tiveram que aguentar o peso das escolhas e que não havia um final feliz. Nasceu a vontade de contar o “outro lado” da história e mostrar
Wallis não como a vilã, mas a vítima da situação. A cena em que
Wallis vê seu nome estampado nos jornais e sente-se julgada pelas pessoas que
passam nas ruas, lembrar muito da própria Madonna, que sempre teve a vida
dissecada pelos jornais e julgada pela opinião publica.
A interpretação de Andrea Riseborough é um destaque, transformando Wallis em uma figura complexa, cheia de dúvidas e muito verdadeira. Outro ponto positivo é a parte técnica do filme, que mostra a obsessão de Madonna pelos detalhes e um time de profissionais gabaritados, como Arianne Phillips, responsável pelo figurino lindíssimo, indicado aos principais prêmios da categoria. A direção de arte ganha força nas cenas que exaltam o luxo e beleza da vida real. Já a edição pode causar um certo estranhamento inicial, com cortes rápidos e a tentativa de estabelecer um paralelo entre as duas tramas, sem ordem cronológica.
A interpretação de Andrea Riseborough é um destaque, transformando Wallis em uma figura complexa, cheia de dúvidas e muito verdadeira. Outro ponto positivo é a parte técnica do filme, que mostra a obsessão de Madonna pelos detalhes e um time de profissionais gabaritados, como Arianne Phillips, responsável pelo figurino lindíssimo, indicado aos principais prêmios da categoria. A direção de arte ganha força nas cenas que exaltam o luxo e beleza da vida real. Já a edição pode causar um certo estranhamento inicial, com cortes rápidos e a tentativa de estabelecer um paralelo entre as duas tramas, sem ordem cronológica.
Comparação: W.E verdadeiro e da ficção |
Madonna poderia ter feito um filme menor, algo menos pretensioso, como gravar um filme convencional
sobre a vida de Wallis. No mundo de Madonna, entretanto, não há espaço para intimismos.
Não podemos negar que ela foi ousada em se arriscar com tramas
paralelas, narrativa não linear e com momentos delicados, como as cenas de agressão. W.E, dessa forma, é um bom filme, que vai
crescendo e nos faz ter muita curiosidade pela história de Wallis e Edward. Se fosse lançado por outro diretor, talvez, o filme não seria massacrado pelos críticos e faria bem mais sucesso. Entre
erros e acertos, Madonna revela-se uma diretora e roterista ousada, mas ainda bem menos interessante do que a cantora. A prova disso é o Globo de Ouro de
melhor canção, para a bela Masterpiece, tema do filme.